segunda-feira, 15 de outubro de 2007

A REFORMA AGRÁRIA COMO MEIO PARA EFETIVAR A JUSTIÇA SOCIAL E ECONÔMICA


Maria Eloneide Mourão1, Mônica Lins Smith2, Sanderlene Pinheiro de S. Melo3, Amarilde de Souza Raulino4

1,2,3,4 Acadêmicos do Curso de Ciências Econômicas do Centro Universitário Nilton Lins





Resumo: O presente trabalho pretende demonstrar a reforma agrária como meio para efetivar a justiça social e econômica. A efetivação só ocorrerá com a modificação da realidade brasileira nas suas mais variadas esferas sociais e econômicas, com seu ponto máximo, ao proceder à divisão da terra rural. Constitui o objetivo precípuo de todas as sociedades democráticas a justiça social, que reflete na vida econômica. Esse ideal se dá pela reforma agrária, através da repartição da terra rural entre os que possuem tradição agrícola e identidade com o meio ambiente em questão, mas não possuem terras para plantar e promover seu desenvolvimento sócio-econômico. O acesso à propriedade rural constitui-se como obrigação do Estado brasileiro e direito subjetivo dos trabalhadores rurais sem terra, regulamentado pelo Estatuto da Terra, em consonância com o artigo 184 da Constituição Federal de 1988, que definiu a desapropriação, para fins de reforma agrária, para atender os princípios da supremacia do interesse público e do bem-estar social e econômico. A Constituição Federal e o Estatuto da Terra são os principais instrumentos para a modificação da realidade rural, embora seja difícil realizá-la, face ao contexto histórico de concentração de latifúndios, do jogo de interesses econômicos que sempre esbarram nos poderes constituídos e no caráter conservador da política brasileira no que se refere às mudanças de base. A reforma agrária é condição para efetivação do Estado Democrático de Direito e as principais conseqüências do acesso do homem agrícola à terra são a desconcentração de renda, o combate à desnutrição, além da interiorização do desenvolvimento e proteção dos direitos humanos.


Palavras-chave: reforma agrária; desapropriação; Estatuto da terra.



Introdução


Em 30 de novembro de 1964 através da Lei 4.504 foi criado o Estatuto da Terra, onde consta no seu Art. 2°: É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei.

A construção coletiva de um país mais justo, democrático e igualitário. Este é o desafio que move o governo, a sociedade, pessoas que buscam implantar um novo modelo de desenvolvimento para o Brasil, capaz de diminuir as imensas desigualdades sociais e econômicas que retratam uma nação com alto padrão de concentração de renda, da propriedade, do conhecimento, da justiça e de tantos outros pontos fundamentais para o exercício pleno da cidadania.

Esse enorme desafio encontra importância estratégica no campo. A agricultura familiar possui um grande espaço de contribuição à geração de renda, o que expressa a necessidade de uma realidade fundiária para o Brasil, concentrada no fortalecimento da agricultura familiar e recuperação dos assentamentos da reforma agrária.

O expressivo universo agrário brasileiro tem sofrido os efeitos da macroeconomia e o abandono de políticas públicas. O Brasil dispõe de um padrão de concentração de terras inigualável no mundo. São grandes propriedades com mais de 1000 hectares. Esse processo de falência e abandono da pequena propriedade contribuiu para o aumento da miséria e da exclusão social nos grandes centros urbanos.

A característica principal da situação agrária brasileira é o forte predomínio da propriedade latifundiária. É o monopólio da terra, vinculado ao capital colonizador. É ainda o monopólio da terra o responsável pela baixa produtividade de nossa agricultura, pelo alto custo de vida e por todas as formas atrasadas, e extremamente penosas de exploração semifeudal, que escravizam e brutalizam milhões de camponeses sem-terra.

Implementar o programa da reforma agrária, com metas claras aumentar recursos para desapropriação, estabelecer formas para assentamentos de famílias, investirem na qualidade daqueles já existentes, além de criar políticas publicas voltadas para a democratização da propriedade rural e sustentabilidade da vida no campo, a fim de efetivar a justiça social no Brasil, não sendo simplesmente um discurso político nos momentos intempestivos de grande mobilidade dos movimentos socais, mas uma realidade.


Metodologia


Em razão da natureza do estudo em questão, o procedimento metodológico empregado próprio da pesquisa, traduziu-se em leitura, análise e interpretação de dados obtidos em investigação de documentos e revisão bibliográfica de livros, relatórios, tese, dissertação, privilegiando a documentação indireta, realizando com isso, uma análise critica do objetivo desse trabalho. Foi necessária, ainda, a consulta em bancos de dados por meio da rede mundial de computadores.

Desenvolvimento

No dia 30 de novembro de 1964 com o golpe militar que destituiu João Goulart, o Marechal Castelo Branco, um dos comandantes do golpe militar de abril de 1964, promulgou a Lei nº. 4.504, conhecida como Estatuto da Terra e que se constituiu efetivamente, como a primeira lei brasileira de reforma agrária. Considerando-se a época e a circunstância políticas de uma ditadura militar, o Estatuto da terra foi considerado uma legislação progressiva.

“A reforma agrária só será prejudicada a uma minoria de insensíveis, que deseja manter o povo escravo e a nação submetida a um miserável padrão de vida”.
(João Goulart, Presidente do Brasil, 1964).

Neste sentido podemos definir reforma agrária como um sistema em que ocorre a divisão de terras, ou seja, propriedades particulares (latifúndios improdutivos) são compradas pelo governo a fim de lotear e distribuir para famílias que não possuem terras para plantar. Dentro deste sistema, as famílias que recebem os lotes, ganham também condições para desenvolver o cultivo. A demanda por reforma agrária sempre foi muito presente na história do Brasil, reivindicada tanto pelos camponeses quanto por outros segmentos da sociedade preocupados com a injustiça do campo.

O direito a terra é uma reivindicação do homem, desde sempre. São dois os usos que pode fazer da terra: possuir um pedaço de chão onde se possa morar e produzir alimentos para a família, ou possuir terras para explorá-las e obter lucro e assim contribuir para o desenvolvimento sócio-econômico do país.

A propriedade da terra sempre trouxe questionamentos para a humanidade: como deve ser dividido, como deve ser explorada, quem deve ter direito aquilo que a própria natureza deu ao homem sem nada cobrar.

A reforma agrária se faz necessária no Brasil, pois a estrutura fundiária em nosso país é muito injusta. Durante os dois primeiros séculos da colonização portuguesa, a metrópole dividiu e distribuiu as terras da colônia de forma injusta. No sistema de Capitanias Hereditárias, poucos donatários receberam faixas enormes de terra (pedaços comparados a alguns estados atuais) para explorar e colonizar. Desde então o acesso a terra foi dificultado para grande parte dos brasileiros. O latifúndio tornou-se patrão, gerando um sistema injusto de distribuição da terra. Quase metade das terras brasileiras está nas mãos de 1% da população.

Para corrigir esta distorção, nas últimas décadas vem sendo desenvolvido em nosso país o sistema de reforma agrária. Embora lento, já tem demonstrado bons resultados. Os trabalhadores rurais organizaram o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) que pressiona o governo, através de manifestações e ocupações, para conseguir acelerar a reforma agrária o acesso a terra para milhares de trabalhadores rurais.

Os movimentos socioterritorias são aqueles que têm o território como trunfo. O exemplo é MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) que ao desenvolver a luta pela terra e pela reforma agrária, conquista assentamentos, ou seja, territórios onde as famílias sem-terra começam uma nova vida. Esse tipo do movimento tem necessidades amplas e entre elas a educação como forma de ressocialização e, por conseguinte, de desenvolvimento com qualidade de vida. Quem controla o território busca cada vez mais expandir os seus conhecimentos, dominar tecnologias apropriadas e saber planejar seu próprio espaço. E para isso, o conhecimento é essencial.

Cabe ao governo todo o processo de reforma agrária através de um órgão federal chamado INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). A reforma agrária é realizada em nosso país dentro das leis vigentes, respeitando a propriedade privada e os direitos constituídos. Não visa apenas distribuir terras, mas sim garantir, aos pequenos agricultores, condições de desenvolvimento agrário e produtividade, gerando renda e melhores condições de vidas para as famílias assentadas.

O Brasil é um país com condições de gerar milhões de empregos no campo, pela disponibilidade de tecnologia, e por um mercado consumidor em expansão. Tem condições suficientes para executar uma verdadeira reforma agrária. Vários segmentos da sociedade atuantes e majoritários apóiam uma revisão na estrutura fundiária do país, fazendo com que o governo assegure os assentamentos dando o apoio necessário às famílias assentadas.

Não sabemos hoje quantas famílias sem-terra existe no Brasil, apenas uma estimativa, segundo alguns movimentos sociais, existe hoje 4,8 milhões de famílias sem-terra. Por outro lado, o Plano Nacional de Reforma Agrária, elaborado em 1986, foi beneficiado de 6 a 7 milhões de famílias.

A luta pela propriedade e pela divisão da terra já provocou e ainda provoca muitos conflitos, aqui e em outros países. Se voltarmos lá atrás na história, lembraremos dos confrontos entre camponeses, burgueses e aristocratas feudal. No Brasil, estas questões ainda não tiveram uma solução definitiva, pois geralmente ainda são resolvidas a partir de confrontos extremamente violentos.

“Todo homem, na verdade, tem direito a aspirar à propriedade, para si e sua família, de um pedaço de terra, sobre o qual estabeleça permanentemente o seu lar e de cuja entranha retire, pelo trabalho o próprio sustento e o dos seus. Assiste-lhe direito a aspirar propriedade e não meramente ao aproveitamento temporário da terra; e não somente à propriedade figurada em títulos e formas jurídicas, senão ao solo mesmo, barro e pedra, firme e resistente a seus pés, e dócil, entretanto, ao esforço de suas mãos. Pois a terra é o ponto de apoio necessário de toda atividade humana e o estádio último de toda iniciativa econômica”.
(D. Vicente Scherer, em seu programa radiofônico - A Voz do Pastor).


Duas organizações de trabalhadores rurais destacam-se entre os movimentos sociais que lutam pela democratização do acesso a terra e por melhores condições de trabalho e salário no campo: a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, e o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra – MST.

A maioria das ações de reforma agrária concentrou-se em áreas de conflito, em que trabalhadores correm efetivos risco de vida. Assim, das 62.044 famílias assentadas, 45.471 estavam em áreas de conflito, onde as pendências foram resolvidas e a posse da terra regularizada.

Segundo pesquisa realizada pelo INCRA, dessas famílias assentadas em áreas de conflito, 27.453 eram posseiros e 18.018, acampados. Em áreas sem incidência de conflitos, foram assentadas outras 16.573 famílias.

Assentamentos em 1996

Fonte: INCRA
Existe um estoque considerável de terras públicas da União e de terras devolutas dos estados, principalmente nas regiões de fronteira, que também está sendo considerado no processo de reestruturação fundiária do país.

O objetivo da reforma agrária não deve ser necessariamente o de aumento da produção agrícola, mas sim o de criar empregos produtivos e rentáveis, para os milhares de brasileiros que buscam o seu sustento no campo. As ações de reforma agrária, por isto, devem estar acompanhadas de programas de apoio ao pequeno agricultor de qualificação profissional, e de geração de emprego no campo.

Nos assentamentos e acampamentos as famílias lutam para melhorar suas condições de vida, mas enfrentam um enorme obstáculo: os baixos índices de escolaridade e os altos índices de analfabetismo. O MST possui uma coordenadoria nacional especializada para educação do campo Para realizar a tarefa educativa de humanização o MST criou escolas no campo, vinculadas a um movimento de luta social pela Reforma Agrária no Brasil. Ela é uma escola pública, com a participação da comunidade em sua gestão. A vinculação dos parceiros com a temática é evidente e marcante. O UNICEF, por todo o seu trabalho mundialmente reconhecido em favor das crianças, está envolvido com a promoção das crianças do mundo rural. A UNESCO vê como necessária à educação básica no campo. A CNBB, como Comissão Pastoral da Terra. A UNB tem um grupo de trabalho de apoio à reforma agrária, que desenvolve diversos projetos educacionais para o meio rural.

Quanto à qualidade dos assentamentos, cerca de 70% do total foram atendidas com serviços de assistência técnica e extensão rural nos projetos de assentamentos. Para garantir a qualidade também foram duplicados os valores investidos por família, que passaram R$ 7,7 mil para R$ 16 mil, envolvendo recursos para elaboração de projetos produtivos, assistência técnica, construção de moradias, cisternas no semi-árido, obras de infra-estrutura básica e de preservação ambiental. Alem de assentar famílias, e qualificar os assentamentos com credito, assistência técnica, saúde, habitação e educação, deve-se também o acesso as políticas publicas do governo federal.

Mesmo o governo tendo implementado estas ações a devastação provocada por esse tipo de reforma agrária “as invasões desordenadas” não melhora a vida dos assentados. Os índices de desenvolvimento humano (IDH) dessas regiões estão abaixo da linha da pobreza. Para o gerente de política agrária da Fetagri do Pará, Manoel Imbiriba, o único produto dessa colonização são os conflitos sociais. “Antes de validar as áreas, eles já levam as famílias. Elas ficam entre grileiros e madeireiros ilegais”, diz. Situação similar à que provocou a morte de Dorothy.

O processo brasileiro de assentamentos nunca se apoiou numa cultura de avaliação. Contrariamente ao que ocorre, por exemplo, no microcrédito urbano, suas instituições não contemplam e não valorizam as responsabilidades dos indivíduos em toda sua cadeia de realizações, do acampado, ao INCRA. A distribuição de ativos para populações vivendo em situação de pobreza é a mais importante premissa para sua emancipação social. O pensamento econômico dos anos 1990 reúne imensa quantidade de trabalhos mostrando que a capacidade de o crescimento econômico reduzir a pobreza é tanto menor quanto maior a desigualdade das sociedades em que ele ocorre. Talvez a maior preocupação do processo de desenvolvimento atual esteja em juntar os dois termos que, convencionalmente a economia coloca como antagônicos: equidade e eficiência.

O acesso a terra é uma oportunidade neste sentido. Sua premissa básica é que unidades produtivas ao alcance das capacidades de trabalho de uma família podem afirmar-se economicamente e ser, portanto, um fator de geração sustentável de renda. É claro que para isso são necessárias condições de acesso a mercados dinâmicos, a crédito, a informações, a educação e a tecnologias.

A reforma agrária é um meio para o fortalecimento da agricultura familiar: não é uma finalidade em si mesma. Apóia-se na premissa de que esta forma produtiva representa, para os beneficiários e para o país, o melhor caminho para a incorporação ao patrimônio produtivo nacional das superfícies agrícolas que se encontram subutilizadas.


Considerações Finais


Infere-se que, com a consagração do estado democrático e social brasileiro os direitos sociais passarão a merecer uma tutela máxima e efetiva. Desta forma, impõe-se ao poder publico no cumprimento de sua tarefa igualitária e distributiva a obrigação de promover a efetividade dos direitos sociais e de neutralizar as distorções e desigualdades econômicas geradas na sociedade.

Conclui-se também que, na qualidade de direitos fundamentais do ser humano, os direitos sociais não podem ser limitados, uma vez que inexistem pretextos que justifiquem a restrição de seus efeitos. Condiciona-los à existência de recursos públicos financeiros significaria retirar-lhes toda a força normativa que os envolve e negar-lhes o regime especial de proteção instituídos pela constituição de defesa dos direitos humanos.

Fica claro, assim, que dimensionar o estoque de terras disponíveis para assentamentos, sua localização geográfica e condições de infra-estrutura social, de produção e de comercialização ainda é tarefa prioritária. Se todo esse processo de transformação e reformas profundas pelo qual o Brasil está passando for mantido, a terra perderá, definitivamente, seu caráter especulativo e sua função de reserva de valor e passará a cumprir sua função social e econômica, em beneficio de uma sociedade menos desigual.

A reforma agrária não é, portanto, apenas econômica. Ela é sobretudo, social e moral. E só poderá ser resolvida mediante a integração dos esforços das três instâncias do governo e de um compromisso efetivo de toda a sociedade.

A reforma agrária não pode estar ligada só com a produtividade, mas entender a terra como lugar de vida, com a manutenção e recriação de espaços de vida na terra. Tem a ver com a qualidade de vida das pessoas e do meio ambiente. Tem que estar ligada com a função social da terra. A produção é importante, mas com respeito à qualidade de vida do solo, do ar, da água, das pessoas.


Referências


MACHADO, Paulo Afonso Leme Direito Ambiental Brasileiro, Malheiros, 7 ed., 1998.
SILVA, Jose Afonso Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, 9 ed., 1992.
BENJAMIN, César; CALDARI Roseli Salete. Projeto Popular e Escolas do Campo. Brasília: Articulação Nacional Por Uma Educação Básica do Campo, 2000.
STEDILE, João Pedro. A questão da reforma agrária no Brasil: Programa de Reforma Agrária 1946 – 2003. São Paulo: Expressão Popular, 2005.
www.soleis.adv.br. Acesso em 25/09/2007.
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